C A R R E G A N D O . . .

Instituto Libertário Cristão

Dr. Norman Horn 

No domingo de Páscoa, entrei em um debate no Facebook no qual se discutia o papel do governo e Romanos 13. Diversos aspectos sobre a relação dos cristãos com o governo estavam sendo levantados, além de citações de Leo Tolstoy, e o tema fundamental era a ideia de um anarquismo cristão. Quando isso acontece, é claro que Romanos 13 é invariavelmente mencionado. Parece-me, entretanto, que esse não é um bom ponto de partida para uma discussão sobre o estatismo na Bíblia.  

Romanos 13 não é o caminho mais curto para se ter razão sobre o governo. As pessoas gostam de frases de efeito, maneiras rápidas para reagir a cenários – e essa é basicamente a forma que a maioria dos cristãos procura tratar Romanos 13. Contudo, inquestionavelmente você não pode discernir o todo do que a Bíblia diz sobre o Estado através de Romanos 13. Parece bom, mas não vai funcionar.  

Um problema substancial que encontramos em Romanos 13 é o da definição de “submissão”. É, por vezes, uma palavra bem complicada para se entender. Por exemplo, Paulo diz em Efésios que nós devemos “nos submeter uns aos outros por reverência a Cristo”. Depois ele diz “esposas, submetam-se aos seus maridos”. Tiago 4:7 nos chama a “nos submetermos a Deus”. Obviamente, não acreditamos que “submissão” nesses versículos signifique a mesma coisa que em Romanos 13. Na verdade, repetidas vezes vemos grandes homens e mulheres da Bíblia – Jesus, Paulo, Pedro, Daniel, Sadraque, Mesaque, Abede-Nego, Davi, Elias e Eliseu – desafiarem o Estado.  

O que de fato interessa é compreender a submissão no contexto de uma teologia bíblica do Estado. Nesse sentido, o que a Bíblia tem a dizer sobre o Estado, sua natureza, sua origem, seu destino e sua relação com Deus é anterior à compreensão do que “submissão” significa.  

Entre em Gênesis, 1 Samuel, os Evangelhos e o Apocalipse. Apresentarei uma rápida visão geral de alguns pontos-chave dos textos selecionados, embora eles possam configurar estudos adicionais em si ou de si mesmos, e haja muito mais a ser estudado do que apenas esses quatro. 

Evidência A: A Torre de Babel (Gênesis 11) é a “história de origem” do Estado. Nós percebemos aqui que o Estado está organizado como uma oposição a Deus. O Estado é rebelde e idólatra e deseja tornar-se/substituir Deus.  

Evidência B: 1 Samuel 8 narra o episódio em que Israel pede um rei (isto é, uma monarquia organizada/“Estado” primitivo). Deus fala a Samuel e conta-lhe o que esse governo irá fazer… e o resto da história você conhece. Apesar dos “anos de glória” de Davi e de Salomão, Israel foi um desastre completo.   

Evidência C: Os Evangelhos, especialmente Mateus, são muito claros quando dizem que o Reino de Deus não é nada parecido com um reino terrestre (leia-se: Estado), e que o Reino de Deus repetidas vezes entra em conflito com os reinos da terra.  

Evidência D: Se formos dar aos símbolos do Apocalipse um significado geral no mundo físico, eles devem primeiramente ser interpretados à luz do Império Romano em conflito com o Reino de Deus que estava por vir. Dado que realmente não havia outros Estados significativos para se considerar no momento em que o Apocalipse foi escrito, nossa extensão dos símbolos ao significado de hoje pode e deveria incluir Estados atuais, anônimos, mas por princípio existentes. Nós percebemos que o destino do Estado é a destruição.  

Agora, podemos retornar a Romanos 13 e nos questionarmos sobre o que a resposta adequada de “submissão” acarreta a uma entidade que seja: 

  1. rebelde e idólatra;
  1. abusiva em relação às pessoas;
  1. constantemente em oposição ao verdadeiro Rei e ao verdadeiro Reino;
  1. destinada à destruição.

A resposta deve ser que a submissão ao poder coercivo do Estado é primeiramente e acima de tudo prudencial. Não seja tolo, não comprometa a igreja ou a sua família, não arruíne seu testemunho para o mundo. Entretanto, isso não significa também que vocês devam se acomodar ao status quo. Escrevi mais extensivamente sobre isso na minha exegese de Romanos 13:1-7.  

Nas palavras de muitos dos fundadores da América, “Rebelião contra os tiranos é obediência a Deus”; mas não precisamos sequer pegar em uma espada para fazê-lo. A legitimidade do Estado repousa em um consentimento tácito das pessoas (Étienne de la Boétie1), e assim as nossas maiores armas são renovar as nossas próprias mentes e, depois, ajudar a renovar a mente de outros (agradecimento a Hayek ao estilo do apóstolo Paulo). O objetivo é afastar a mente das pessoas do Estado voltando-a para o Rei dos Reis. 

*Este artigo foi originalmente publicado no Libertarian Christian Institute.


Nota
  1. Étienne de la Boétie foi um humanista e filósofo francês do século XVI que abordou a relação entre os povos e a submissão ao governo de um só homem (Discurso da Servidão Voluntária), além de elementos referentes à estrutura de dominação, à opressão e às formas de vencê-la, entre outras perspectivas desse tema maior. ↩︎

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