C A R R E G A N D O . . .

Instituto Libertário Cristão

Randy England 

No artigo Jesus e os Impostos: O Imposto do Templo, nós examinamos a primeira das declarações de Jesus sobre o dever de pagar impostos. Naquele exemplo, Jesus começou dizendo que ele não era obrigado a pagar o imposto, mas depois instruiu Pedro a pagar o imposto pelos dois. Essa orientação para sujeitar-se às autoridades – a fim de evitar uma ofensa desnecessária – mais tarde se tornaria um tema recorrente ao longo do Novo Testamento. Mais adiante os evangelhos nos dão a resposta mais conhecida de Jesus sobre pagamento de impostos a César. 

O confronto com o qual Jesus se deparou no “Deem, portanto, a César” é encontrado em Lucas 20:21-26, Marcos 12:13-17 e no capítulo 22 de Mateus. Todos os três evangelhos registram o episódio, que ocorreu pouco depois da entrada triunfal de Jesus em Jerusalém:   

Então os fariseus saíram e começaram a planejar um meio de enredá-lo em suas próprias palavras. Enviaram-lhe seus discípulos juntamente com os herodianos que lhe disseram: “Mestre, sabemos que és íntegro e que ensinas o caminho de Deus conforme a verdade. Tu não te deixas influenciar por ninguém, porque não te prendes à aparência dos homens. Dize-nos, pois: Qual é a tua opinião? É certo pagar imposto a César ou não? “ 

 Mas Jesus, percebendo a má intenção deles, perguntou: “Hipócritas! Por que vocês estão me pondo à prova? Mostrem-me a moeda usada para pagar o imposto”. Eles lhe mostraram um denário, e ele lhes perguntou: “De quem é esta imagem e esta inscrição? “ 

“De César”, responderam eles.

E ele então lhes disse: “Deem, portanto, a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”.

Ao ouvirem isso, eles ficaram admirados; e, deixando-o, retiraram-se1.

Jesus, “ciente das más intenções deles” percebe de forma precisa a armadilha que os fariseus haviam armado para ele: “Por que vocês me colocam à prova, seus hipócritas?”. Se ele dissesse para pagar o imposto, as pessoas – que odiavam o governo romano – o desprezariam. Se ele aconselhasse contra o pagamento do imposto, os romanos iriam prendê-lo. Jesus não reponde à pergunta imediatamente. Ao invés disso, pede a moeda de denário usada para pagar o imposto: “De quem é esta imagem e esta inscrição”?, pergunta.

“De César”, responderam eles, pois ela tem o retrato de César e a inscrição: “César Augusto Tibério, filho do Divino Augusto”. Alguém poderia se perguntar se os conterrâneos de Jesus hesitaram para lhe dar uma dessas moedas. Ela tem uma imagem gravada (altamente ofensiva para os judeus) e identifica tal imagem com o retrato do filho de um deus. Eles podem ou não ter reconhecido a blasfêmia.  

Agora, imagine os apóstolos de Jesus que estavam ali perto. Eles ainda tinham a declaração de Pedro ecoando em sua cabeça: “Tu és o Cristo, o filho do Deus vivo”, que Pedro tinha há pouco declarado a Jesus (Mateus 16:16). A ironia é grande: os inimigos do verdadeiro Filho de Deus sendo levados a mostrar a Jesus uma imagem de um falso filho de deus. Alguém poderia pensar que os inimigos de Jesus estariam tentando medir forças com ele, mas o que eles queriam de verdade era a sua resposta à pergunta que lhe fizeram. 

Jesus finalmente respondeu: “Deem, portanto, a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus”. Essa poderia ter sido uma resposta inequívoca se Jesus tivesse antes deixado claro exatamente o que o era de César e o que era de Deus. 

O Catequismo da Igreja Católica – ao apoiar o pagamento de impostos – jamais sugere que esse episódio apoia o pagamento de impostos.

Apesar da ambiguidade da resposta dada por Jesus, esse episódio tem sido visto com frequência como uma aprovação ao pagamento de impostos a César; contudo, Jesus nunca insinuou – com fizeram alguns analistas – que a imagem de César e a inscrição na moeda provassem a propriedade de César. Nós podemos apenas supor que a moeda inicialmente pertencia a César. Talvez a moeda, em algum momento, tivesse sido cunhada na Casa da Moeda da Família de Tibério, dessa forma transferindo direitos de propriedade para o novo detentor da moeda. Nesse caso, a moeda no mínimo pertencia ao homem que a tirou do seu bolso. Não pertencia mais a César. 

Até mesmo o Catequismo da Igreja Católica – ao apoiar o pagamento de impostos – jamais sugere que esse episódio apoia o pagamento de impostos. Na verdade, o Catequismo vale-se desses versos para reiterar a obrigação de um cristão de desobedecer às “autoridades civis quando suas exigências são contrárias àquelas de uma consciência correta” CCC ¶ 2242. 

Se justificar uma tributação pelo Estado fosse uma leitura oficial da passagem, a Igreja certamente a teria citado para esse fim. Uma vez que a lição principal desses versos diz respeito às nossas obrigações em relação a Deus, permanece ainda a confusão de como a resposta de Jesus deveria ser tomada no que tange ao pagamento de impostos. A resposta depende de quem estava ouvindo.  

A ordem de Jesus para “dar a Deus o que é de Deus” teria enfatizado – na cabeça do judeu do primeiro século – que considerar o título de César em relação à moeda do tributo (ou a qualquer outra coisa) em comparação ao senhorio de Deus deixa César em desvantagem. Sinceramente, César não tem nada. Ao ouvir a resposta de Jesus, as pessoas jamais a teriam tomado como um endosso ao pagamento dos impostos de César. 

Por outro lado, Jesus foi suficientemente ambíguo de tal forma que os romanos ficariam satisfeitos com a sua resposta, pelo menos por tempo razoável para evitar sua prisão imediata. Os romanos eram tão lentos em perceber as coisas que, mais tarde, – no julgamento de Jesus – foi necessário que os chefes dos sacerdotes explicassem a Pôncio Pilatos que Jesus estava de fato ensinando contra a obrigação de pagar impostos: E assim eles começam a acusá-lo, dizendo, “Encontramos este homem subvertendo nossa nação e nos proibindo de pagar tributo a César …” (Lucas 23:2).  

Essa acusação não era inteiramente verdadeira, pois – como fica claro pelo episódio do imposto do Templo – Jesus de fato não proibiu o pagamento do imposto, apenas questionou a legitimidade do imposto. César – e cada governante antes e depois – simplesmente não tinha o direito de tomar, por força ou ameaça, a propriedade e o salário de outros homens. Contudo, a Igreja nos diz para nos submetermos à autoridade do Estado sempre que a nossa consciência permitir.  

Da mesma maneira que Jesus disse para pagar o imposto – porque sua missão exigia que eles “não fossem motivo de tropeço” – seus apóstolos mais tarde fariam o mesmo. Esse é um tema que perpassa todas as cartas do Novo Testamento e a história da Igreja.  

Vamos examinar os motivos para essa submissão em postagens futuras.

*Este artigo foi originalmente publicado no Catholic Libertarians.


Nota de rodapé
  1. Mateus 22: 15-22. Disponível em: <https://www.bibliaonline.com.br/nvi/mt/22>. Acesso em 11 jan. de 2020.  ↩︎

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